Coitada da chuva (Poor rain)

 
Tenho pena da chuva. Fenômenos atmosféricos, assim como qualquer outro tipo de fenômeno são mal interpretados pelo brasileiro. O brasileiro só conhece bem a desgraça. O fenômeno, até pela esporadicidade, sofre preconceito. Deve ser por isso que aqui no Brasil ocorram mais desgraças que fenômenos.
 
Aos fatos: a grande responsável pelo apagão no Brasil é a chuva (tema esse já discutido por esse escritor nessa mesma coluna há algum tempo); mesmo assim, agora que começará a temporada de chuvas no Brasil, já houve protestos na TV contra a chuva. E por que? Por causa da dengue. Ah sim, um entendido em doenças falou que se aumentarem as chuvas, o Brasil corre o risco de ter um número recorde de mortes causadas pelo Aedes Egypt(?). Mas um entendido em energia elétrica também falou que se não chover o apagão continua.
 
Uma das grandes artes do brasileiro (depois de sambar, jogar bola, encher a cara e comer baranga) é colocar a culpa no próximo. Arte milenar aprendida com os índios. E esse pessoal da mídia vinha bem com essa história. Quando há uma chacina, o culpado é sempre o indivíduo que morreu. Se um avião caiu e todos morreram, erro do piloto. Se houve uma enchente e 249 pesssoas foram pro saco, culpa do rio. Fraude no painel? Culpa do servente que limpa o chão do senado. Essa tática é boa porque o acusado é sempre o cara que não tem como se defender. E nessa lista de impotentes quanto à defesa entram os fenômenos atmosféricos. Segundo levantamentos estatísticos, o El Niño foi culpado por aproximadamente 39 crimes e US$ 3 bi em prejuízos. Em segundo lugar vem a chuva, que sempre ocorre na hora errada. A seca em terceiro, o granizo em quarto, o efeito estufa em quinto, os raios ultra-violetas em sexto e os coliformes fecais em sétimo.
 
O grande vacilo da mídia foi ter usado o mesmo bode espiatório para dois conflitos diferentes: apagão e dengue. Mas como o povo brasileiro é burro o suficiente pra não saber que o problema do apagão já foi previsto há uma década e o culpado pela dengue é ele próprio, resta entrar no grande primeiro conflito do século XXI: torcer pela chuva e pela energia elétrica ou torcer pela seca e por menos mortes pela dengue?
 
Cá pra nós, eu torcerei para que ocorra a pior epidemia de dengue da história e que, mesmo assim, falte energia. Chova ou não. (Augusto Leonardo)